terça-feira, 17 de setembro de 2013

CHANDLER, HAMMETT e DENBOW




Já aqui falei de Raymond Chandler e já falei também de Dashiell Hammett, ambos escritores de romances policiais. Imagine-se que, desta feita, vou falar destes escritores como personagens de um romance policial!
Se dúvidas houver, bastárá ler um livro suegstivamente intitulado "Chandler", tanto no original como nas traduções. É da autoria de outro escritor de romances policiais, William Denbow (pseudónimo de Georges Stiles), que resolveu envolver os dois colegas de arte nesta teia onde há violência e muito álcool.
Quase todas as críticas que li, em inglês, não são favoráveis, tais como esta, recolhida de Biil Crider:

The blurb on the back cover is from Peter McCurtin, who says, "A wild idea but it works. The writing is smooth, the action violent." The last statement is true. Everything else is a lie, including the words "a" and "the." (You know who I stole that from, right?) The writing is awful, and the idea doesn't work at all. If you want to find out why Hammett was such a success, read Chandler, where everything goes wrong. Instead being published by a big-name hardover house, Chandler came from Belmont-Tower, one of the really low-end paperback publishers.
Possuo um exemplar da edição portuguesa (e brasileira) das Edições Europa América, inserido na colecção Clube do Crime (nº7), de 1982.
Da sinopse, posta em contracapa, pode ler-se:
"Não existia a mínima cordialidade entre Dashiell Hammett e Raymond Chandler , dois dos maiores escritores que a América jamais produzira, mas quando Hammett foi ameaçado por um assassino vingativo, Chandler não hesitou em intervir, mesmo que não fosse bem-vindo. Hammett necessitava de auxílio, porque estava adoentado, bebia em excesso e não efectuava o mínimo esforço para se manter vivo. Chandler, à semelhança do seu herói - Philip Marlowe - muniu-se de uma pistola e preparou-se para um duro combate."
Pois bem, nem sei o que dizer sobre este aproveitamento de dois nomes da litaratura policial para se forjar um romance do género. A ideia pode ser boa, mas não me parece que o caminho para a atingir fosse o mais apropriado. Com personagens "reais", nunca se sabe onde começa e acaba a ficção. Há ali, nesta obra invocada, uns equívocos que baralham o leitor e não são efectivamente o retrato dos dois grandes escritores, pois ambos não saem  beneficiados desta fotografia tremida. A própria capa da edição americana traz a ilustração de um "Chandler" que não é mais do que a do actor Ralph Byrd, de Dick Tracy.
A tentativa não é inédita, pois há uma outra obra intitulada "Hammett" da autoria de Joe Gores, que eu não li.
Para não influenciar, deixo ao critério de quem quiser ler esta obra uma possível crítica. Talvez ainda alguém caia na ideia de querer fazer um romance policial onde entrem, como personagens do tablado escrito, Dick Haskins e Dennis McShade (para os menos atentos, pseudónimos dos escritores portugueses António Andrade Albquerque e Dinis Machado).
 


3 comentários:

  1. Já li esta obra há muito tempo, na edição da Europa-América, e devo tê-la ainda algures num recanto desta casa cheia de livros, por isso não me lembro bem do enredo, a não ser que metia em cena os dois célebres escritores.
    Tanto se tem falado e escrito sobre Hammett e Chandler que eles, de certo modo, acabaram por se tornar também figuras de ficção, pois muitos pormenores das suas biografias foram (re)inventados. Sendo assim, por que não dar largas à imaginação e à liberdade criativa da escrita, utilizando-os como personagens de um romance policial, ou seja, colocando-os no seu próprio terreno, como imagens de um espelho com duas faces?
    Para mim, a parte mais fascinante da ficção é a que aproveita o real para despertar o imaginário, ancorando-se, no caso do policial, naquilo que o leitor conhece dos seus personagens e no que perspectiva que poderia acontecer, se eles jogassem com o destino sob os mesmos nomes mas com outras personalidades.
    Lembrei-me, a propósito deste livro de William Denbow, de uma curiosa ficção de um autor português, Frank Gold (pseudónimo de Luís Campos), sobre outro autor que ficou célebre: Ross Pynn (ou Roussado Pinto). Como escreveu L.C. numa nota introdutória, o seu livro "trata de uma personagem lendária - Ross Pynn - que o mais certo é nunca ter realmente existido". "Eu, Ross Pynn", título deste livro, é uma história onde Roussado Pinto, na pele do seu heterónimo, se cruza com os seus próprios personagens.
    Já imaginaram o que seria Agatha Christie a contracenar com Poirot ou Conan Doyle a desafiar Sherlock Holmes?

    Um abraço do
    Jorge Magalhães

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  2. De facto, sendo bem escrito, um livro que leve à sua trama a figura real de um autor, comparsa nas lides da escrita, merece a atenção dos leitores, como aquele anúncio de uma marca de champô - "é dois em um"; o livro de um escritor com outro escritor lá dentro.
    Luís Campos era amigo de Roussado Pinto e vice-versa. Ambos criativos, com capacidades intelectuais elevadas, era natural que assim fosse. E Luis Campos, na altura com o pseudónimo de Frank Gold (com o qual assinou, entre 1965 e 1986, 6 obras), dedicou uma ao seu amigo, que foi o nº 6 de uma das colecções da Europress e que o Jorge refere.
    Eu conheci o dono da gráfica~que editou essa colecção,situada na Póvoa de santo Adrião, a Pentaedro, pois fui lá levado e apresentado por um amigo comum, o Rebocho Vaz. Na altura, estava em perspectiva eu fazer uma obra em BD sobre o Magriço, projecto que não se concretizou.
    O dono da gráfica, muito simpático e muito culto, falou-me sobre uma obra ali recém-editada - Mataram-no Duas Vezes - de Luís Avelar e Pedro Massano, e pretendia algo que despertasse a atenção dos leitores. Mandei-lhe uns esquiços sobre o Magriço, feitos com as legendas em rodapé do desenho, estilo Foster, mas ele queria estilo Santos Costa e não Foster. E eu, teimoso como uma mula, queria o desenho limpo de balões.
    Serve isto para dizer que, nessa altura, a simpatia e cortesia do proprietário da editora, colocou-me nas mãos, para além da obra referida atrás, a colecção do Bolso Noite (para além de livros sob as temáticas western, terror e ficção científica), onde vinham várias obras do Luís Campos, que julgo ter sido o coordenador da colecção.
    Luís Campos, para além de professor catedrático, era um incansável escritor, pois só nesta última referida colecção conseguiu fazer imprimir, com o seu nome e apelido, 9 títulos, sendo que o último saiu em 1989. Em 1983 e 1984, editou, também nesta colecção, 3 romances em cada ano.
    Seria interesante uma obra em que o autor contracenasse com uma ou várias das suas personagens. Há autores que entram nos seus livros na pele de uma das figuras - geralmente a principal - e há aqueles que, pelo sim pelo não, entregam o enredo a uma descrição na primeira pessoa do singular. Eu fi-lo em muitos contos que enviei para a revista Maria, mas em nenhum era eu próprio (antes fosse), pois esses naipes de figuras que narravam na primeira pessoa, à guisa do autor que se assume personagem de ficção, eram, na sua maioria, galãs e conquistadores, nanja eu. O meu livro policial, a sair lá para o fim do ano, é um destes casos (eu isto, eu aquilo), mas do Santos Costa não há nada, a não ser a vontade de querer ter sido aquilo tudo.
    Lembro agora que o Geraldes Lino tem uma secção no seu blogue sob o tema: o autor contracena com as suas personagens. E lembro-me que o Amigo Jorge Magalhães editou uma bd minha, onde eu "entrei" na pequena estória, armado em fanfarrão, conduzindo um tigre pela trela(!).
    Tão bem sabem estas recordações!

    Um grande abraço
    Santos Costa

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  3. Mal sonhava eu, ao referir-me ao livro do Luís Campos sobre o Ross Pynn, que iria despertar-lhe tantas memórias. Ainda bem!

    Um grande abraço do
    Jorge Magalhães

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